sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Batman - O Super-Herói da Mente V - O Outro Lado da Moeda do Cavaleiro das Trevas

por
Corto de Malta

Isaac Newton elaborou as três leis da Física. A terceira delas é conhecida como Lei da Ação e Reação. Diz que para toda ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade.

Parte I


A partir do momento em que o Batman se tornou algo próximo a um Deus de uma cultura primitiva no Inconsciente Coletivo de Gotham City, o surgimento de alguém como o Coringa foi algo natural. Como se uma mitologia surgisse daí. E, diferente do que Friedrich Nietzsche poderia pensar, estes dois "Super-Homens da Mente" e a reação de um a ação do outro não trouxeram algo tão novo assim.

Josepeh Campbell comentou sobre algo parecido no documentário O Poder do Mito:

"É por isso que os Palhaços são bons. Porque eles mostram que a imagem não é um fato, mas sim um reflexo, algumas vezes. [...] As melhores histórias sobre deuses brincalhões aparecem nas narrativas dos índios americanos. Muitas vezes temos uma figura brincalhona que é, ao mesmo tempo, um deus criador. Isso significa: eu não sou a imagem suprema. Sou transparente por alguma coisa. Através de mim, da minha forma  engraçada... caçoando dela... e transformando-a numa ação grotesca... você pode alcançar o sentido de que, se eu fosse uma grande presença sóbria você ficaria preso à imagem."
É o que ocorre com a mitologia de Gotham envolvendo Batman e o Coringa. É o mesmo princípio utilizado para fazer com que o Palhaço diga a frase que se tornou icônica em Batman - O Cavaleiro das Trevas e que nos fala muito sobre a natureza da obra:



"Por Quê Tão Sério?"
Christian Bale também enxergava estes personagens icônicos como componentes de uma mitologia:

"É uma fábula da mesma maneira que a ideia do super-herói é uma fábula. É ele o centro de novas mitologias. Desta vez o mito chama-se Batman ou Homem-Aranha, mas a figura continua a ser mitológica, um pouco como os deuses gregos de antigamente. Não estou dizendo que estes novos ídolos devam ser adorados da mesma forma, ou que acreditemos neles da mesma maneira, mas em tudo que tem a ver com identificação pessoal, sim, acho que fazem parte de uma fábula. Comparamo-nos a eles. Como eles, perguntamo-nos perante os maiores dilemas morais: e agora, se fosse eu a ter estes poderes e se fosse eu a tentar salvar o meu mundo, que decisão tomaria?"







Parte II



Thomas Huxley elaborou uma teoria sobre o "jogador do outro lado do tabuleiro":

"O tabuleiro de xadrez é o mundo, as peças são os fenômenos do universo, as regras do jogo são o que chamamos as leis da Natureza. O jogador do outro lado está escondido de nós. Sabemos que seu jogo é sempre justo e paciente. Mas também sabemos, à nossa custa, que ele nunca faz vista grossa para um erro, ou faz o menor indulgência para a ignorância. Para o homem que joga bem, as maiores apostas são pagas com esse tipo de generosidade transbordante do que com os fortes indícios de deliciar-se com força. E aquele que joga mal recebe xeque-mate sem pressa, mas sem remorso."




Este conceito de Huxley foi usado pelo escritor Mike Barr nos quadrinhos de Batman para criar o personagem Espreitador, que seria antítese do herói. Guardadas as devidas proporções também podemos empregá-lo para definir a relação entre Batman e Coringa no universo cinematográfico concebido por Christopher Nolan. Na cena do último encontro entre eles no filme, ao ser salvo pelo Batman, o Coringa coloca isso em outras palavras:


"Eu sabia que você não ia me deixar cair. Você é mesmo incorruptível, não é? É isso o que acontece quando uma força que não pode ser parada encontra um objeto que não pode ser movido. Você não vai me matar por algum senso de moralismo inapropriado e eu não vou te matar porque você é divertido. Eu acho que nós estamos destinados a fazer isso pra sempre."


Esse é um dos mais conhecidos exemplos de paradoxo. É como a lenda chinesa em que a lança que não pode ser detida encontra o escudo que não pode ser quebrado. Nolan deliberadamente colocou os personagens assim, como peças no seu tabuleiro:


"Existe um paradoxo aqui. O Batman não irá matá-lo. E o Coringa simplesmente não quer derrotar o Batman porque ele é completamente fascinado por ele e gosta do combate. É uma armadilha para ambos."


Mas, assim como nas mitologias, os mortais tornam-se vítimas dos deuses. Harvey Dent e sua transformação em Duas Caras é a representação máxima de uma cidade partida pelo embate entre as ideologias da Ordem (Batman) e do Caos (Coringa). Uma das maiores ironias do filme é quando ele está interrogando perigosamente um dos capangas que estavam no atentado no funeral do Comissário Loeb e o Batman o impede de continuar explicando que aquele era um paciente do Asilo Arkham, o tipo de mente perturbada que  o Coringa atraía. Batman estava naquele instante negando o óbvio diante de seus olhos. Praticar roleta russa com aquele bandido demonstrava que Harvey também era o tipo de mente perturbada que  o Coringa atraía.

Foi como se o Herói se deixasse contagiar pelo Mito pessoal de Harvey, o Cavaleiro Branco, e não quisesse enxergar defeitos nele. E provavelmente o símbolo mais perfeito em O Cavaleiro das Trevas, aquele que mais nos conta sobre a Psique de todos os personagens, é a Moeda de Duas Caras.



Parte III

Heráclito chamou de Enantiodromia o conceito de que uma grande força em uma direção gera uma força em sentido oposto. Platão e Carl Jung adotaram esta ideia, que também influenciou Newton. Jung a aplicava para explicar o conflito entre o Consciente e o Inconsciente. Platão dizia:


"Tudo surge desse modo. Opostos criando opostos."

É isso o que ocorre em Gotham City. Batman surgiu como uma força oposta ao crime organizado que havia se tornado desproporcional por causa da intervenção da Liga das Sombras na economia local causando uma Depressão. Isso é ilustrado no início de O Cavaleiro das Trevas quando o Herói viaja até a China clandestinamente para capturar Lau. Batman surgiu para situações como essa, para ir aonde o longo braço de lei não era tão longo.




E por ser peça central no tabuleiro de Gotham, cada uma de suas identidades refletiu-se em uma peça diferente. O verdeiro Bruce Wayne refletiu-se em Harvey Dent, o destemido promotor público em busca de justiça e apaixonado por Rachel Dawes, apelidado de Cavaleiro Branco de Gotham. Batman refletiu-se no Coringa. E o Bruce Wayne Playboy refletiu-se no escroque Coleman Reese. Sim, Coleman Reese é um personagem sem carisma que surge desastradamente tentando chantagear Bruce Wayne e acaba sendo salvo por ele. Mas isso é natural, visto que ele é o reflexo da Persona (Máscara), ou seja, de alguém que não existe. Resumindo: ele é um Peão do Tabuleiro de Xadrez.

Claro que o Batman, por ser uma espécie de "Deus", também é refletido por seus admiradores que se vestem de Batmen para combaterem o crime. Mas este efeito colateral não se compara a união entre a máfia liderada por Sal Maroni - sucessor de Carmine Falcone - e o Coringa. É inclusive lançando mão deste argumento que o Coringa os convence a contratarem os seus serviços. Se o Batman foi uma resposta natural ao crime organizado, o Coringa foi uma resposta natural ao Batman. É a Escalada que James Gordon previu no fim de Batman Begins.



Como o Coringa decidiu ir além em sua loucura, ele estava decidido a fazer toda a Gotham mergulhar num processo evolutivo e tornarem-se "super-homens" no seu ponto de vista, ou loucos na visão mais ortodoxa. Seu plano de fazer o Batman quebrar sua regra de não matar era mais um de seus blefes - o Coringa é um grande jogador e o fato de personificar uma carta de baralho talvez não seja coincidência e pode nos indicar outra pista sobre seu passado como X.

Como ele mesmo disse, não apostaria a batalha pela Alma (Psique) de Gotham numa briga direta com o Batman. E daí seu Ás na manga: corromper o promotor Harvey Dent. Ou seja, o Duas Caras seria o reflexo do Coringa.





Durante O Cavaleiro das Trevas, o Coringa e seus homens plantaram várias  bombas no filme sem serem descobertos. Mas de fato, o Palhaço sempre teve ajuda. Seja da máfia ou dos policiais corruptos pagos por ela. Foram eles que o ajudaram com a bomba no carro da juíza, a bomba com a Rachel, a bomba com o Harvey, a bomba na delegacia e as bombas no hospital.

É claro que no fim, quando todos veem que o Coringa foi longe demais, como Maroni diz à Gordon, ninguém teria interesse em ajudá-lo a destruir a cidade. Então como o Coringa conseguiria plantar as bombas nas barcas no meio de uma fuga em massa de vários cidadãos e prisioneiros de Gotham? Afinal, em nenhum outro caso como neste o esquema de segurança deve ter sido tão difícil de burlar e, justamente aí o Palhaço não tinha mais o mesmo apoio logístico. Pois aí está. Ele não poderia planejar isso porque não ele planejou.

Quem armou pra pôr as bombas nas barcas não foi o Coringa, foi o Duas-Caras!




Só alguém ligado às mais altas autoridades de Gotham - o Prefeito, o Comissário de Polícia, o Promotor - poderia conhecer um esquema de fuga como aquele. Só uma pessoa que conhecesse o plano de segurança para evacuação da cidade saberia onde, quando e como plantar bombas ali. Momentos antes da evacuação, o Coringa e o Duas Caras estavam conversando no hospital. O Coringa aparece a seguir deixando o local, mas não vemos por onde o Duas Caras saiu. Sabemos só que depois dali ele começou a caçar os policiais e mafiosos responsáveis pela morte de Rachel. Aliás, é interessante notar como em poucos minutos o Duas Caras resolve uma série de conflitos com vários personagens que não foram resolvidos nem por Batman nem pelo Coringa no filme inteiro.

Mas será que ele só se contentaria com isso? Harvey Dent não foi apenas traído por Gordon e seus homens, ele se sentiu traído por Gotham. O Coringa tinha acabado de convencê-lo de que o caos e o acaso eram mais fortes e honestos do que a noção de "Justiça" institucionalizada que ele sempre defendera. Mesmo que o Coringa tenha dado a ordem aos capangas, a ideia foi do Duas-Caras.



Por quê?
Porque eram DUAS bombas em DUAS barcas! Quem conhece o vilão nos Quadrinhos sabe que isso é praticamente um fetiche pra ele. Caso tivesse sido o Coringa a arquitetar o plano haveria de alguma forma uma terceira barca. Explicarei mais sobre essa teoria num capítulo posterior. Por ora, nos concentremos no Duas Caras e nas duas barcas.

De um lado estavam os supostos cidadãos honestos, por quem a mulher que ele amava tinha morrido, e do outro os cidadãos punidos pela lei de uma cidade corrupta. E quem foi o responsável por prender a maioria daqueles homens? O Promotor Harvey Dent. O mesmo que agora passara a duvidar do sentido destas ações.



Botar o controle da detonação da barca oposta na mão de cada um é o mesmo que jogar uma moeda com o destino deles. Lançar a sorte. Se ele considerava que o seu Eu anterior foi injusto punindo esses homens por uma lei que ele não mais acreditava, essa era a forma de corrigir as coisas na sua mente, utilizando a Justiça na qual agora confiava como "Super-Homem Mental": o acaso. Porém, o Duas Caras não esperava que o Coringa quisesse explodir tudo de qualquer jeito quando os próprios cidadãos não apertaram o detonador, e o Batman tivesse que impedi-lo.

Parte IV

Segundo Campbell nos sistemas religiosos antigos a figura da Mãe era mais importante que a do Pai. As antigas civilizações dirigiam-se a divindade principal como Mãe Terra por serem agricultores. A partir do momento que haviam mais grupos de caçadores a divindade masculina passou a ocupar este lugar. Esta divindade feminina se sobreporia a todas as demais sendo a própria representação do universo:



"A fêmea está além do tempo e do espaço. Ela é o tempo e o espaço... e o mistério que existe para além dela. Está além dos pares de opostos. Não é macho nem fêmea. Mas tudo está contido dentro dela. E os deuses são seus filhos. Tudo o que se pensa e tudo o que se vê é produto da deusa."

Na trilogia de Nolan, quem é a Deusa Mãe? Gotham! A cidade tem nome feminino, mas não tem gênero. Não é macho nem fêmea. Tudo está contido nela. Batman, Coringa e Duas Caras, estes "deuses" modernos, vieram dali, de suas experiências na cidade. São "filhos" de Gotham e seus pensamentos e formas de enxergar o mundo são produtos dela.



Agora vamos pegar novamente a noção de Inconsciente Coletivo de Jung. Toda a Gotham representaria o Inconsciente Coletivo onde estariam "mergulhados" seus cidadãos como icebergs flutuando no Oceano com apenas uma ponta pra fora d'água, representando suas Consciências. A seguir vamos nos afastar provisoriamente do mapeamento que Jung fez da Psique humana e retomar a visão de Sigmund Freud, que era mais simples. Ele a dividiu em Id, o repositório das pulsões e desejos, Super Ego, o conjunto de regras apreendidas com o mundo exterior, e Ego, o ponto central de convergência.

Na HQ Asilo Arkham o Chapeleiro Maluco sugere que Gotham é uma cabeça, uma cabeça que sonha seus habitantes. Nolan adaptou isto da seguinte forma: em Batman - O Cavaleiro das Trevas Gotham é um Personagem. Coringa, Batman, Harvey Dent e Duas Caras são as diferentes Identidades que fazem parte deste Personagem, pois são carismáticos e, além do Bem e do Mal, expressam os desejos muitas vezes conflitantes da Coletividade. Coringa é o Id, Batman é o Superego e Harvey Dent\Duas Caras é o Ego. Sim, Batman, Coringa e Duas Caras são o mesmo personagem. 




E todo o tom das atuações de Christian Bale, Heath Ledger e Aaron Eckhart ajuda a compor este cenário maior. Cada um poderia estar vivendo as diferentes possibilidades de uma mesma pessoa ao longo da vida.

Batman é uma criança, quer recuperar sua infância perdida, o Coringa reflete um comportamento anárquico e de contestação comum na adolescência e, tanto as identidades Harvey Dent quanto Duas Caras, representam uma visão mais adulta e pragmática da situação e de como lidar com ela. Nada de se fantasiar-se de Morcego ou fazer piadas elaboradas com explosivos e cartas de baralho. Basta jogar uma moeda e testa sua sorte com um revólver.





No fim do longa metragem o Id (Coringa) impulsiona o Ego (Duas Caras) a se deixar levar por seus desejos primitivos e vingar a morte da amada. Então o Superego (Batman), após neutralizar o Id,  corrige as atitudes do Ego, impedindo-o de matar inocentes. Além disso, assume a culpa pelos crimes que o Id o insuflou a cometer. Assim o Ego torna-se novamente Harvey Dent, como atesta a bela cena em que o Batman vira a face queimada do Duas Caras para o chão, colocando pra cima a face saudável de Harvey Dent. Como se, após sua morte, ele pudesse se purificar e voltar a ser quem era e o Vilão voltasse a ser Herói.

E quando faz isso, o Morcego está simbolicamente virando a Moeda de Duas Caras do próprio Harvey com a face boa para cima.

Parte V



No filme Festim Diabólico, de Alfred Hitchcock, o cineasta inspirou-se numa história real e nos apresentou dois jovens, Brandon e Philip, que também tentam aplicar as teorias de Nietzsche cometendo o crime perfeito. Acreditando-se superiores, mataram um colega de faculdade estrangulando-o com uma corda, esconderam o cadáver no baú, e deram uma festa no seu apartamento convidando amigos e familiares do morto e servindo a comida e a bebida em cima desse baú.

Toda a argumentação crítica à sociedade de um dos assassinos que era o mentor intelectual do projeto, Brandon, é bastante semelhante a do Coringa em O Cavaleiro das Trevas. E Brandon também tem um alvo para sua obsessão, o Professor Cadell, que lhe transmitiu os ensinamentos de Nietzsche que ele distorceu, e que era uma das raras pessoas que Brandon enxerga também como Além Homem ou Super-Homem, como ele.



Curiosamente, a ficção é repleta de psicopatas com comportamentos similares em certos aspectos, especialmente sobre estes alvos que são tratados diferentes das demais vítimas. Em A Morte Pede Carona de Robert Harmon, John Ryder é um psicopata de estrada que mata motoristas que lhe dão carona e desenvolve uma estranha relação com um deles, Jim Halsey a ponto de tentar levá-lo a cometer os mesmos crimes.

Em O Silêncio dos Inocentes de Jonathan Demme o Dr. Hannibal Lecter é um psicopata canibal obcecado pela agente do FBI Clarice Sterling. Numa trama anterior, Dragão Vermelho, o mesmo Dr. Lecter mantinha relação semelhante com o agente que o prendeu, Will Graham. 



O mangá e na série animada Monster de Naoki Urusawa, conta a história do sinistro Johan Liebert, uma espécie de Super Psicopata (o único dos citados a atingir níveis tão extremos como o Coringa) que cria um laço afetivo e uma relação sádica de interdependência com o médico que lhe salvara a vida quando criança, Dr. Kenzo Tenma, que é uma alma generosa e prestativa, exatamente o oposto do outro.

Em vários momentos ele tanta induzir o médico a atirar nele da mesma forma que o Coringa tenta induzir o Batman atropelá-lo com a moto. Voltamos então ao simbolismo da moeda do Duas Caras. Um objeto composto por duas faces que se completam, uma perfeita e outra riscada. Mas que integram o mesmo corpo.



Um dos "Espelhos" mais fascinantes de Batman - O Cavaleiro das Trevas ocorre neste ponto. A obsessão do Duas Caras pelo Comissário Gordon espelha-se na obsessão do Coringa pelo Batman. É por isso que no final do filme o Duas Caras joga na sorte da moeda a vida ou a morte de cada pessoa que ele julga estar envolvida na morte de Rachel. Os policiais corruptos, Maroni, Batman. Mas não joga a moeda para Gordon. Em vez da vida do Comissário, ele joga a vida do filho dele. Porque assim como o Coringa faz com o Batman, o Duas Caras queria fazer Gordon experimentar o mesmo que ele sente. Neste caso, assistir alguém que ama morrer.

Esta também foi a maneira de Nolan mostrar que o Coringa não era um psicopata comum porque o alvo de sua obsessão não era nada comum. Por Gordon ser apenas um policial, o impacto daquela ação de confronto com seu algoz afetou apenas seu círculo íntimo. Por Batman ser uma lenda, seu confronto com seu inimigo quase destruiu Gotham.



É como se, evocando a Jornada do Herói de Campbell, o Batman tivesse conseguido o elixir mágico durante o primeiro filme, só que esta "mágica" pudesse enlouquecer as pessoas. De alguma forma, em algum momento, ele passou o elixir para o Coringa que o passou a Harvey Dent\Duas Caras que por sua vez queria passá-lo ao Comissário Gordon, que provavelmente também teria enlouquecido e passado adiante até enlouquecer toda a acidade, caso o Batman não tivesse interferido e, ao se jogar com o Duas Caras do alto do prédio pra salvar o menino, tivesse assim "pego o elixir de volta".

No final do capítulo anterior eu conclui mostrando que o Batman de certa modo aceitava seu fardo e por isso não matava o Coringa. Ele não conseguiu fazer o mesmo pelo Duas Caras e termina por matá-lo acidentalmente para salvar a vida do filho do Comissário Gordon. De certa forma uma criança conseguiu algo que nem o Coringa conseguiu, fazer Batman quebrar sua regra. Isto seria justificado pela profunda identificação que o Herói tem com crianças na Trilogia, sendo as mesmas representações da Identidade Bruce Wayne, que ainda está presa no poço da sua mente.



Mas se Batman não poderia salvar o Duas Caras, ele poderia salvar Harvey Dent. E com isso salvar Gotham. Pois o Batman não pode vencer o Coringa definitivamente como o Coringa não pode vencer o Batman definitivamente, - eles são o paradoxo - mas Harvey Dent pode. Como Batman afirma, ele foi o símbolo de justiça que o Morcego jamais conseguiu ser por, diferente dele, lutar contra os fora da lei dentro da lei. Harvey havia lhe dito quando se conheceram:

"Ou você morre Herói ou vive o bastante para virar o Vilão."



Então Batman entende a mensagem e o que deve fazer, ao dizer a Gordon:

"Ou você morre Herói ou vive o bastante para ver você mesmo virar o Vilão."
Você Mesmo = Si Mesmo (Self).

E mais uma vez simbolicamente a Moeda é virada e a simetria do destino é perfeita. Se antes Harvey assumiu a culpa pelos crimes de que Batman era acusado tomando o lugar de Bruce Wayne, agora Batman assumirá a culpa pelos crimes que Duas Caras cometeu tomando o lugar de Harvey Dent. Tornando-se um pária ele conseguiria anular o Coringa e sua influência e anular a Si Mesmo e a sua própria influência, gerando assim uma "mágica" nova e mais poderosa.


Além disso, algumas pessoas são mais perigosas mortas do que vivas e Batman conseguiria assim transformar Harvey Dent, o Cavaleiro Branco, na maior lenda de Verdade e Justiça da história de Gotham City, tornando-o um mártir de uma causa, a luta por Justiça, que seria abraçada por todos. Como dito no longa metragem anterior as pessoas precisam de exemplos dramáticos e haviam respondido positivamente a isso ao pouparem a vida uns dos outros na cena das barcas.

"As vezes as pessoas merecem mais do que a Verdade. Elas merecem ter sua fé recompensada."
É assim que ele convence o Comissário Gordon, fazendo o verdadeiro e maior sacrifício à Deusa Mãe... o sacrifício de receber apenas o sofrimento e dar a honra e a glória provenientes do gesto de heroísmo intrínseco o sacrifício para serem usufruídos por outro. Por amor a Gotham City. Por isso quando Gordon a princípio não aceita a troca dizendo ao Batman que ele não era um bandido, seu amigo lhe responde:

"Eu sou aquilo que Gotham precisar que eu seja."




No momento em que os cidadãos de Gotham se voltam contra o Herói que jurou protegê-los é inevitável lembrar as palavras proféticas do Coringa e reconhecer que, afinal, ele tinha razão:

"Para eles, você é apenas uma aberração, como eu! Eles precisam de você agora, mas quando isso não acontecer mais, eles vão te jogar fora, como um leproso! "

Mais tarde é este o modo ambíguo que Gordon contará a história enquanto manda caçar Batman como um cão:

"Um Herói... não o que merecíamos. Mas o que precisávamos que ele fosse."



Mas naquela noite ele teve que dar outra explicação ao filho. E podemos imaginar que no Inconsciente do Batman aquele garoto gritando para ele voltar e não mergulhar irremediavelmente nas Trevas de sua agonia não era o James Gordon Jr... Era Bruce Wayne.

Tudo no filme remete ao conceito de Outro Lado da Moeda. O Outro Lado da Moeda de Bruce Wayne é Harvey Dent. O Outro Lado da Moeda da Barca com os Cidadãos Comuns é a Barca com os Prisioneiros. O Outro lado da Moeda da máfia é o Batman. O Outro Lado da Moeda do Batman é o Coringa. O Outro Lado da Moeda do Coringa é o Duas Caras. O Outro Lado da Moeda do Cavaleiro Branco é O Cavaleiro das Trevas.







5 comentários:

Anônimo disse...

Texto merda hein corto...

Anônimo disse...

Incrível como o Corto continua com essas viadagens junguianas com esse filme... Puta que pariu

É só um filme de ação policial e pronto. Deixa de punhetação pretensiosa.

Corto de Malta disse...

Se você pode ser pretensioso de vir aqui ditar o que o filme é ou deixar de ser e o que eu devo achar ou deixar de achar, por que eu não posso ser pretensioso também?

Ressoar Espiritual disse...

Obg pela análise

Cleber disse...

estou muito feliz por achar essa anlise do filme...cara, vc conseguiu minha atenção.
parabens pelo trabalho.

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