sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Da Prensa: Três Sombras

por
Corto de Malta

Até onde você iria para salvar a vida do seu filho? Essa é a premissa dessa graphic novel sobre a fatalidade.

Vencedora do conceituado Festival de Angoulême, Três Sombras é um belo trabalho do artista espanhol Cyril Pedrosa, motivado em um trágico acontecimento. A morte do filho pequeno de um casal de amigos. Testemunha dessa experiência, Pedrosa construiu a trama que gira em torno do garoto Joachim, que vive feliz numa casa de campo ao lado dos pais, Lise e Louis. O lugar e a época nunca são precisamente revelados, mas há um certo toque de magia no ar que dará a entender que estamos acompanhando o desenrolar da história num universo fantástico, o que vai se tornando mais explícito conforme a trama avança.

Certo dia, como que por acaso, três figuras sombrias das quais só se distinguem vultos montados a cavalo, surgem paradas no alto da colina em frente a casa. Elas não se movem, apenas encaram a até então feliz família. Quando o pai se aproxima, elas desaparecem sem deixar rastro. Mas não tardam a retornar mais e mais e vezes, cada vez mais próximas. Pouco a pouco, começa a ficar claro para os apavorados pais que o alvo do desejo daqueles estranhos cavaleiros é o pequeno Joachim.


Quando Lise vai a cidade próxima e recorre a velha feiticeira local, ela descobre a verdade, mas nós, o público, jamais ficamos sabendo exatamente do que se trata. Pela reação da mãe, no entanto, sabemos que é algo terrível que não pode ser detido, assim como o único mal irremediável. Neste ponto, ciente do destino que aguarda seu filho, a mãe faz um imenso sacrifício. Decide dar ao pai a chance de fugir com a criança, não por acreditar que Louis consiga mantê-la a salvo, mas para dar aquele inconformado homem o tempo necessário para aceitar sua perda.

Assim ela abre mão de desfrutar seus últimos momentos com o filho em favor do pai. E é aí que começa uma épica jornada entre pai e filho.

Pedrosa capricha na técnica do pincel seco criando uma HQ belíssima, mas onde a beleza do traço leve e expressivo em momento algum perde o foco da proposta narrativa. Louis vai carregar Joachim até o fim do mundo para mantê-lo longe das famigeradas Três Sombras. Após um início aparentemente promissor, a dupla vai párar num navio em alto-mar com todo tipo de gente. Lá Louis começa a perceber que está lidando com algo além dos seus limites, pois fica claro que As Três Sombras parecem interessadas em brincar com eles e assombrar não só pai e filho, mas a todas que cruzam seu caminho.

Seria isso mesmo?

Após algumas reviravoltas, surge um novo personagem e um pai desesperado faz um acordo até então inimaginável para proteger seu filho. A partir daí as misteriosas Três Sombras finalmente mostrarão sua face e personalidade, surgirá um antagonista e caberá dessa vez ao pequeno Joachim salvar o pai de si mesmo.
"Pai, eu não posso mais viver na palma da sua mão." 
Nunca fica exatamente claro quem ou quê são as Três Sombras, porém é escancarado aquilo que elas  representam e que Louis daria tudo para evitar: a morte do filho. Apesar de eu achar que Pedrosa poderia ter entrado mais no desenvolvimento da mitologia da sua obra, é fato que o tema da graphic novel não é esse.

E exatamente por esse tema, e pelo amadurecimento tanto de Joachim quanto de Louis, o autor passa de uma premissa de mistério que flerta de leve com o terror para um caminho mais ortodoxo no fim, com a punição dos maus e o consolo aos bons. Nesse caso o valor do drama humano suplanta qualquer potencialidade perdida.

Publicado no Brasil pelo Quadrinhos na Cia., um selo da Companhia das Letras que publica HQs,  também é uma ótima dica de presente pro dia dos pais. Uma HQ lírica e meditativa que procura mostrar da melhor maneira possível que a morte faz parte da vida, utilizando para isso uma poética metáfora. No fim há uma analogia que me chamou atenção, sobre a simplicidade da natureza, que na sua sabedoria criou ramos de árvores mais curtos e outros mais longos.


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