"Se o que você escreveu soa como algo escrito, escreva de novo."
Morreu ontem dia 20 de agosto de 2013, Elmore Leonard, um dos mais famosos escritores noir. Leonard ficou conhecido pela estilo coloquial de sua prosa e por seus diálogos secos e certeiros, que influenciaram gente do naipe de Quentin Tarantino.
Várias de de seus livros e contos viraram filmes e séries, além dele próprio ter colaborado com alguns roteiros próprios. Jackie Brown, Galante e Sanguinário, Os Indomáveis, Justified, O Nome do Jogo, Irresistível Paixão, Joe Kidd, etc. todos saíram de obras suas.
Como homenagem, eis 10 regras do autor para se escrever histórias de ficção:
1. Nunca abra um livro com o clima
Se for apenas para criar uma atmosfera, e não a reação de um personagem ao clima, você não deve se alongar muito. O leitor vai ficar tentado a folhear as próximas páginas à procura de pessoas. Há exceções. Se acontecer de você ser Barry Lopez, que tem mais maneiras de descrever gelo e neve do que um esquimó, você pode fazer todos os relatórios de tempo que você quiser.
2. Evite prólogos
Eles podem ser irritantes, especialmente um prólogo depois de uma introdução que vem após um prefácio. Mas estes são normalmente encontrados em não-ficção. Um prólogo num romance é história de bastidores e você pode encaixá-las em qualquer lugar que você queira. Há um prólogo em "Doce quinta-feira", de John Steinbeck, mas ele é ok. porque um personagem do livro toca num ponto em comum com as minhas regras. Ele diz: "Eu gosto de muita conversa em um livro e eu não gosto de ter alguém me falando com o que o cara que está falando se parece. Eu quero descobrir como é pela maneira com que ele fala... descobrir o que o cara está pensando pelo que ele fala. Eu gosto de alguma descrição, mas não muita..."
3. Nunca use um verbo além de "disse" para relatar o diálogo
A linha de diálogo pertence ao personagem: o verbo é o escritor metendo seu nariz. Mas "disse" é muito menos invasivo do que "resmungou", "engasgou", "advertiu", "mentiu". Uma vez, eu notei Mary McCarthy terminando uma linha de diálogo com "ela asseverou" e tive que parar de ler para consultar o dicionário.
4. Nunca use um advérbio para modificar o verbo "disse"
"... ele admoestou gravemente". Usar um advérbio desta maneira (ou de quase qualquer outro jeito) é um pecado mortal. O escritor está agora expondo-se seriamente, usando uma palavra que distrai e pode interromper o ritmo da troca com o leitor. Uma personagem de um dos meus livros conta como ela costumava escrever romances históricos "cheios de estupros e advérbios".
5. Mantenha os pontos de exclamação sob controle
Você não tem permissão para usar mais de dois ou três a cada 100 mil palavras em uma prosa. Se você tem a destreza para brincar com exclamações como o Tom Wolfe faz, você pode jogá-las aos punhados.
6. Nunca use as expressões "de repente" ou "o mundo desabou"
Esta regra não requer uma explicação. Eu tenho notado que os escritores que usam "de repente" tendem a exercer menos controle na aplicação dos pontos de exclamação.
7. Use dialeto regional, gírias, com moderação
Uma vez que você começa a soletrar foneticamente as palavras dos diálogos e de encher a página com apóstrofos, você não será capaz de parar. Observe a forma como Annie Proulx capta o sabor das vozes do Wyoming em seu livro de contos "Curto alcance".
8. Evite descrições detalhadas dos personagens
Essas, Steinbeck dominou. Em "Colinas parecendo elefantes brancos", de Ernest Hemingway, como o "americano e a menina com ele" se parecem? "Ela tirou o chapéu e o colocou sobre a mesa". Esta é a única referência a uma descrição física na história e, ainda assim, vemos o casal e reconhecemos o tom de suas vozes, com nenhum advérbio à vista.
9. Não entre em muitos detalhes descrevendo lugares e coisas
A menos que você seja Margaret Atwood e possa pintar cenas com a linguagem, ou consiga descrever paisagens com o estilo de Jim Harrison. Mas, mesmo que você seja bom nisso, você não vai querer que as descrições levem a ação, o fluxo da história, a uma pausa.
10. Tente deixar de fora a parte que os leitores tendem a pular
Uma regra que me veio à mente em 1983. Pense no que você pula quando lê um romance: parágrafos grossos de prosa em que você vê palavras demais. O que o escritor está fazendo: ele está escrevendo, talvez recorrendo mais uma vez ao clima, ou então está na cabeça do personagem. O leitor não quer saber o que esse cara está pensando ou não se importa com isso. Aposto que você não pula os diálogos.
Minha regra mais importante é uma que resume todas essas dez: se soa como escrita, eu reescrevo.
FONTE: O Globo.
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